terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Cosmópolis - Uma bela adaptação

Eric Michael Packer, um homem de negócios que com somente 28 anos já conquistou um império financeiro tecendo operações financeiras que têm como objetivo obter lucros sobre valores sujeitos às flutuações do mercado mundial, é considerado o garoto dourado das finanças norte-americanas.

Nova Iorque, a cidade em que vive, abriga Manhattan, povoado no qual pulsa o coração da economia dos EUA, Wall Street. Mas justamente aí tudo indica que o sistema capitalista está ruindo; as bolsas de valores estão oscilando perigosamente, revoltas contra a globalização invadem a Times Square e a intensa circulação de veículos se agrava com a chegada do Presidente a esta metrópole.

Neste dia tumultuado do ano 2000 Eric desperta, olha a paisagem do alto de seu triplex no edifício mais elevado do Planeta, e toma uma resolução que promete mudar sua vida. Contra todas as expectativas ele resolve cortar o cabelo. Sai em sua limusine só na companhia de seu motorista e dos seguranças.

O protagonista passa o dia todo no carro para atravessar somente dez quarteirões de Manhattan; seu veículo tem praticamente tudo de que ele necessita: bebidas, toalete, aparelhos ligados à internet e câmaras de vídeo. Contando com esses recursos o magnata pratica especulação contra a moeda do Japão, mas esta insiste em se valorizar.

Ao longo desta jornada decadente se depara muitas vezes, casualmente, com Elise, a quem ele se unira em matrimônio alguns dias antes. A jovem é igualmente multimilionária. O relacionamento se desintegra cada vez que ambos se encontram, já que a jovem se dá conta da crescente infidelidade do marido.

Eric percebe pouco a pouco quanto sua vida é desprovida de sentido, enquanto sua existência e a riqueza acumulada vão desmoronando; toda aposta do antes bem-sucedido especulador resulta no mais completo fracasso. Sua fortuna e a de Elise, que ele não hesita em arriscar, são arrebatadas, junto com toda a instituição financeira do Planeta.

O protagonista não encontra meios para deter o avanço da crise, e torna-se um mero espectador diante do desenrolar dos fatos e da ruína de seu reinado. É desta forma que ele vivencia o dia mais transformador de sua trajetória existencial. Além de tudo, tem certeza de que está a um passo de ser assassinado.

A narrativa brilhante de DeLillo indica mais do que a carência de significado de uma vida em particular; ela revela o quanto os alicerces que apóiam o universo contemporâneo podem ser fatalmente frágeis. Seu texto contundente provoca desconforto e impregna cada evento de um sentido especial.

A história foi recentemente adaptada para os cinemas em uma produção franco-canadense dirigida pelo cineasta David Cronenberg. O filme Cosmópolis, protagonizado por Robert Pattinson e Juliette Binoche, estreou no final de 2012 nas telas brasileiras.

Don DeLillo nasceu em Nova Iorque no ano de 1936. Ele é considerado um dos autores mais importantes da literatura norte-americana atual. O escritor conquistou várias premiações, entre elas o National Book Award (1985), o PEN/Faulkner (1992), o Jerusalem Prize (1999) e a medalha Howells da Academia Americana de Artes e Letras (2000).

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Akira

Desde a primeira seqüência até o segundo final, o espectador fica literalmente fascinado pelo encadeamento frenético de imagens em Akira. Como se misteriosa droga alucinasse não só seus personagens, mas cada cinéfilo transposto para o núcleo da ação. Tudo começa em mais uma das violentas noites da Neo-Tóquio de 2019, trinta anos após o término da Terceira Guerra Mundial.

O cenário, terrivelmente sombrio, evoca uma era pós-apocalíptica. O medo, o fanatismo, o caos, a corrupção política, o terrorismo, estão sempre presentes. Gangues de motoqueiros combatem em becos escuros. Esta cidade dominada pela ambição, ganância e jogos de poder, parece caminhar, inexoravelmente, para novo e predestinado abismo. O pesadelo está prestes a começar.

Em típica atmosfera shakesperiana, a luta pelo poder absoluto, supremo, caminha lado a lado com a disseminação de poderes extra-sensoriais. Os psíquicos encontram-se sob estudo e controle do Estado e da Ciência, que definitivamente não detêm o mesmo objetivo. Os paranormais são detectados logo cedo, seqüestrados, catalogados como projetos experimentais, numerados e mantidos sob observação. Os principais são a sensitiva e profetisa Kiyoko, o psicocinesista Takashi e Masaru, que possui a terceira visão.

Todos os personagens criados por Katsuhiro Otomo – autor e diretor da história – são detalhadamente elaborados e desenvolvidos. Não existem heróis e vilões, ou caracteres centrais. Kaneda e Tetsuo são membros de uma violenta gangue e estudantes da Escola Técnica. O primeiro, tímido e complexado; o outro, líder do grupo e egocêntrico. Key, exceção aos tipos femininos criados por Otomo, é corajosa e sensível terrorista. O Coronel Shikishima, membro da Defesa Aérea, é um dos únicos a conhecer o terrível segredo de Akira. Cada um deles é peça-chave desta história carregada de símbolos de destruição-reconstrução do Universo.

Akira é um projeto coletivo, fruto da colaboração entre a arte e a mais sofisticada tecnologia. Alia profundo humanismo à pesquisa de recursos tecnológicos inovadores. Seu trabalho de animação imbui-se tanto do esforço artesanal de Otomo na elaboração do ‘storyboard’, quanto das mais complexas e recentes técnicas de computação e de fotografia das células desenhadas. Mizutani, o diretor de arte, tem liberdade total para o uso de cores não convencionais, trabalhando muito com o verde e o vermelho.

Aliás, o número de cores usadas ao longo do filme é impressionante – 327! Em alguns momentos é fácil esquecer que se trata de animação, tamanho o senso de realidade que nos transmitem a cidade e seus habitantes – extremamente animados de vida! Paralelamente à estética visual, contribuem – para criar desde os momentos de harmonia até os do mais apocalíptico pesadelo – a indescritível trilha de efeitos sonoros e a música do Geinoh Yamashirogumi.

Não se sabe, ao longo do filme, qual a verdadeira intenção de Otomo ao criar o universo de Akira. Mostrar um mundo futuro e fictício, porém possível, ou o presente, já impregnado de germens da destruição, o qual caminha, inconsciente, movido por cega ambição, para uma nova era de trevas. Mas, segundo Otomo, os seres ainda podem deter a corrente do tempo e escolher entre vários destinos.